sábado, 9 de maio de 2009

Renovações e Informações

Alô, caros leitores.Sei que fazer post dissociados de assunto não é bem, mas tem uma série de coisinhas que tenho que tratar:

Primeiro, no clima da vigésima-quinta análise publicada neste esporádico blog (pois é, em quase dois anos... não sei se isso é pouco ou muito), eu fiz uma renovação visual na página, mudando, entre outras coisas, o logo (sim, este não foi feito no Paintbrush - mas também demonstra que ainda não aprendi a arte milenar do Photoshop-Fu), limpando outras coisas, e adicionando uma blogroll de blogs que eu gosto.Em alguns deles eu conheço seus escritores, já falei com eles, mas a grande maioria nem deve ter consciência de que eu existo, visto minha conduta discreta na internet.

Enfim, passando pra outros assuntos...



Com um atraso relativo aos meus prezados colegas A.L.A.S., do Gameretrô e César do First Stage (de estranho - esse é o Gamer Atrasado, afinal), estou postando aqui nosso pequeno experimento audiofônico, o Retrocast, um podcast dedicado á jogos antigos de toda origem.E o asunto inicial são os arcades, aqueles adoráveis trambolhos que fizeram parte da vida de todo mundo que se considera fã de jogos.Lógico que tem uns probleminhas na gravação (como o fato de que minha voz está bem baixa em relação á de meus colegas), já que esta foi nossa primeira tentativa em fazer um podcast.Mas se você quer ouviu uns nerds bacanas falando um monte de besteira (e vamos ser sinceros, porque você não ia querer?), então, baixe e aproveite!

E fique ligado para mais novidade em breve...

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Mama Don´t Go, Daddy Come Home

Muito se discute sobre como melhorar a narrativa presente nos jogos eletrônicos; se fala em quebrar com antigos padrões de estruturação de história, fazer com que mecânicas de jogo representem mensagens complexas sobre a condição, e outras tantas idéias vanguardistas.Mas a verdade é que muito pouco é feito para avançar a narrativa nos jogos, até porque aqueles com idéias novas e interessantes estão fazendo jogos pequenos jogos independentes, que passam longe do conhecimento do grande público, esse mesmo público cuja opinião a respeito da integridade artística dos jogos que esse povo que discute tanto quer mudar.A fazer um jogo é um negócio difícil; é preciso de uma equipe dedicada, de muito tempo e dinheiro, e de apoio de uma grande empresa distribuidora preocupada muito mais com os seus lucros do que com o impacto emocional do futuro joguinho.Portanto, para um indivíduo fazer um projeto com uma visão de autor nessa indústria maluca, então, ele precisa ser bastante influente, paciente, e também um pouco maluco.Mas quando o resultado final é bom, quem sabe não vale o esforço?


Mother 3 foi lançado para Game Boy Advance pela própria Nintendo em 2006, (e antes que alguém venha reclamar no meu ouvido que ele não é antigo o suficiente para figurar aqui, eu digo que quem manda nessa pocilga aqui sou eu, ora pitombas), como a sequência direta de EarthBound, para Super Nintendo (que lá em terras nipônicas é Mother 2 mesmo).E a série Mother é, dentro de todas as franquias da Nintendo, o título mais idiossincrático; é uma série de RPGs tipicamente japoneses, que ao mesmo tempo adere e tira um sarro das principais convenções do mais adorado gênero dos nossos amigos de olhos puxados.Por exemplo, uma das características mais notáveis é que a série se passa num mundo moderno, semelhante ao nosso, ao invés dos típicos reinos de fantasia que permeiam o gênero.Mas apesar disso, os jogos da série não tem nada de realistas, e são cheios de situações estranhas e cômicas, e inesperadas (quem quiser um nipo-roleplay moderno, mas com mais seriedade, estará mais bem servido na série Persona, da Atlus). É algo que, tematicamente, varia entre uma interpretação muito estereotipada da cultura norte-americana, a interpretação do mundo pelos olhos de uma criança (algo que marca muito o segundo episódio - que eu tenho que zerar um dia...), drama familiar, e devaneios de imaginação provocadores, tudo fruto da bitolada mente do idealizador da série, Shigesato Itoi.


Tudo isso contribuiu para que a série fosse estranha demais para os padrões ocidentais (apenas de justamente fazer uma reflexão deles).O primeiro jogo da série, para NES, nunca chegou á esse lado da linha do Equador, enquanto o segundo, o já mencionado Earthbound, foi lançado, porém não obteve o sucesso esperado.Esses fatos fizeram com que a série ganhasse a pecha de "ovelha negra" entre os engravatados de Nintendo of America, e provavelmente foi o que, junto com o final do ciclo de vida do GBA, impediu o lançamento do terceiro episódio no Ocidente (entre outros fatores que serão discutidos posteriormente).Mas foi aí que algo verdadeiramente mágico aconteceu.Você vê, toda essa esquisitice crônica da série Mother fez com que ela ganhasse fãs distintamente fervorosos, que não apenas adoram a série, como tudo que existe relacionado á ele.Esse povo gente boa se reuniu no Starmen.net, o maior fansite de Mother/Earthbound da internet (e que impressiona pelo profissionalismo e capricho), e decidiu fazer o que é certo com as próprias mãos.Não, eles não foram encher os engravatados previamente mencionados de bolacha; e sim, fizeram uma tradução, direto do japonês, por conta própria.E após muito trabalho duro, finalmente, no ano passado, a tradução ficou pronta, e foi disponibilizada na internet (e você pode baixar aqui).E o resultado não é nada menos que impressionante, talvez decorrente do fato que tradutores profissionais trabalharam nela, sem ganhar nada, apenas pelo amor á série.


E sim, isso também quer dizer que o jogo foi jogado em emulador.Não, não é legal, e tanto não é, que os responsáveis pela tradução se disponibilizaram em retirá-la da internet caso a Nintendo requeresse.Até agora, a empresa de Kyoto não se manifestou, e pelo jeito, provavelmente não vai, até porque as chances de Mother 3 dar as caras oficialmente em idioma de gente (he,he,he nada contra o hiragana e o katakana, amiguinhos otakus-metaleiros) são minúsculas.Mas aproveitando que o assunto a respeito da legalidade discutível da emulação, vou aproveitar para dizer umas coisinhas que queria á muito tempo, mas as amarras de tema deste pendular blog não permitiam.Vamos lá:

"Há muito tempo atrás, quando este blog dava seus primeiros passos, um tempo de análises de seis parágrafos e Top 7 (lê-se Top Sete), eu cantava loas ás maravilhas da emulação.Mas pra ser sincero, com o tempo, eu acabei me distanciando desse método, mas por razões de entendimento de jogo (um jogo foi pensado pra ser jogado de uma determinada forma, com uma determinada dificuldade - e os emuladores, com suas acelerações de tempo e saves á qualquer hora, subvertiam a experiência original), do que propriamente por impedimentos morais.Precisamente por isso, o último jogo jogado desta forma foi o Astro Boy:Omega Factor - não por coincidência, o último título para GBA analisado aqui no GA.Mas eu queria trazer esse assunto á baila porque a emulação (especialmente no Brasil), é vista sobre um filtro hipócrita, que a traveste de pirataria.Sim, não é uma coisa legal, e essencialmente, você está consumindo por algo que não pagou.Acontece que como o acesso á jogos eletrônicos originais aqui ainda é escasso e elitizado, a emulação é a única forma de contato de muitos jogadores com jogos que, certamente, eles não teriam acesso.E no Brasil, é melhor apelar pra isso do que para o obsceno e escancarado comércio pirata de jogos.Ninguém gasta dinheiro, ninguém ganha dinheiro; é o mais triste dessa história toda é que nós os jogadores, não temos poder nenhum de mudar essa situação.E quem tem poder para isso (leia-se: os legisladores da nação e as empresas estrangeiras de jogos) não se importam com essa situação, e ao invés disso, ficam procurando soluções mais fáceis, como botar a culpa no inocente útil que é o consumidor de produtos piratas.Eu não recomendo o uso de emulador pelos motivos mencionados acima, mas até parece que os meus comentários vão fazer muita diferença no cínico cenário dos jogadores brasileiros. É realmente uma pena que toda uma geração de jogadores está se acostumando a entender jogos, e o consumo destes, de uma forma equivocada.E o pior, eu sou um desses."

OK.Já tiramos isso do caminho.Agora que acabou a mudança brutal de assunto, querido leitor, vai buscar um copo d’água e depois continue a ler.

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Pronto?Já foi?Agora vamos voltar ao assunto.Onde eu tinha parado?


A trama de Mother 3 se passa em Nowhere Islands, ilhas que, apropriadamente, se localizam no meio do nada.E é nessas ilhas que fica localizada a idílica vila de Tazmily, um lugar onde todos se conhecem pelo nome e trabalham em comunidade para o bem de todos, e um sujeito mudo de três metros de altura fica tocando um sino toda vida. É aí que o jogador conhece os personagens principais, os gêmeos Lucas e Claus, e sua mãe Hinawa, tirando umas férias na casa do vovô, e brincando com os filhotes de dinossauro (que aparente são muito dóceis nessas partes do mundo).Outros personagens importantes da trama são Flint, o pai caubói dos gêmeos (cuja composição inicial e nome parecem ser uma referência á Clint Eastwood - mesmo que seu papel mais adiante na trama remeta mais aos filmes mais recentes de Eastwood do que aos de bangue-bangue), o ladrão manco de mau hálito Duster (que também é um grande baixista), a princesa "tomboy" Kumatora, o cachorro Boney, e o macaquinho Salsa.Vale lembrar que no começo do jogo e quando os personagens são apresentados, você tem a opção de nomear como quiser todos esses; inclusive, no início, você também tem que nomear outras coisas menos convencionais, como sua comida favorita.


Continuando, as coisas vão muito calmas nas imediações da vila de Tazmily, até que um dia, surge uma ameaça, na forma da misteriosa Pigmask Army, uma armada formada por sujeitos estranhos vestidos de, sim, você adivinhou, porcos.Sabe-se lá porque, os invasores suínos começam a fazer experiências bizarras com a fauna local, e a derrubar as florestas.Os atos iniciais desses espíritos-de-porco acabam por fazer o jogo, que até então começara de uma forma ensolarada e alegre, quase infantil, a ter uma abrupta virada para o trágico.E sem querer estragar muito, basta dizer que esse momento encapsula o perfeitamente o tom de Mother 3 (e o estilo narrativo do Itoi), aliando de forma não muito sutil, porém extremamente eficaz, o cômico e o dramático, uma dualidade que vai se ditar os rumos da história que vai se seguir.E a trama deste jogo não se diferencia da concorrência apenas pelo seu conteúdo, mas também a forma como ele se desvela; a trama é dividida em oito capítulos, e durante os três primeiros, os fatos são presenciados por determinados personagens, passando, respectivamente, pela busca de Flint pelos seus filhos, de Duster por um objeto mágico, e de Salsa para se livrar do controle do bigodudo, viciado em bananas e árabe (!) vilão Fassad.Do capítulo 4 em diante, a perspectiva principal, e também a honra de ser o protagonista mudo, recaem sobre Lucas, o "bebê chorão", cujo personagem gradativamente evoluí até se tornar genuinamente carismático, mesmo praticamente não dando um pio durante a jornada.Esse rodízio de protagonistas não é algo exatamente novo em se tratando de RPGs (uma premissa semelhante foi executada em Dragon Quest 4), mas aqui serve para deixar a história bem amarrada e concisa, além de mais instigante.


Em termos práticos, Mother 3 não trará muitas surpresas para veteranos da série, onde RPGs nipônicos; aqui, os personagens também exploram mapas, lutam contra monstros em batalhas por turnos, ganham itens e aprendem magias, e passam de nível.Mas o jogo (e a franquia Mother em geral) apresenta uma guinada diferente para cada mecânica batida do gênero.Por exemplo, aqui os inimigos estão visíveis no mapa, evitando os chatos encontros aleatórios comuns em jogo desse tipo; também, o jeito como você se aproxima do inimigo afeta o desenrolar da batalha, já que chegar por trás do oponente faz você ter iniciativa no embate, e vice-versa.Outro detalhe interessante é a forma que os personagens capazes de usar magias (aqui denominada PSI) as aprendem; elas aparecem não após a passagem de nível, e sim, subitamente, enquanto os seus personagens andam pelo mapa e começam a sentir calores estranhos.Também, é possível correr (exceto quando um membro do seu grupo está sentindo esses calores), uma novidade para a série, simplesmente dando um toquinho numa coisa imaginária chamada "botão B", como dizem os personagens do jogo .


O sistema de batalha, por sua vez, merece um parágrafo a parte; embora ele á primeira vista seja bastante simples, em primeira pessoa (outra influência da série Dragon Quest) ele tem uma série de minúcias que vão sendo compreendidas a medida que o jogador vai avançando.Por exemplo, na interface de batalha, os números que representam a energia (HP) e os pontos de PSI (PP) são apresentados na forma de um contador, e quando o dano causado pelos inimigos é computado, o contador começa a cair regressivamente;isso quer dizer que se o jogador for rápido o suficiente, pode se livrar um personagem de ser derrubado o curando rapidamente, ou terminando logo a batalha.Além disso, um outro elemento novo na série é introduzido neste episódio, o sistema de Combos Sonoros; quando um personagem causa dano á um inimigo, o jogador pode tentar bater ritmadamente na tecla de ataque de acordo com a batida música de fundo do combate, como numa versão lo-fi do supimpa Rhythm Tengoku; caso o jogador consiga manter o ritmo, o inimigo levará pontos de dano adicionais.Se o jogador for meio sem ritmo (como eu, por exemplo - se eu tivesse um mínimo de aptidão musical, estaria numa banda de rock, blues e músicas estranhas, angariando mulheres dinheiro e fama - necessariamente nessa ordem - e não esporadicamente escrevendo num blog obscuro nos confins da internet), ele pode hipnotizar os inimigos para descobrir a batida individual de cada um.


Esse sistema de combate parecesse ser uma extensão lógica do hábito de jogadores de RPGs de esmurrar freneticamente a tecla de atacar para sair logo de uma batalha, mas basta dizer que essa tática não funciona muito, até porque, Mother 3 tem diversas músicas diferentes para as batalhas, e não apenas um único tema repetido á exaustão; vai ser difícil para muitos depois de jogar este título voltar a jogar RPGs com musiquinhas repetitivas, principalmente porque a trilha de Mother 3 é muito legal, cheio de composição estranhas, porém, plenamente assobiáveis, e que vão permanecer por um tempo na cabeça de quem jogar, (especialmente o "leitmotif" do exército dos porcos - esse recurso musical continua sendo subutilizado nos jogos, apesar da sua eficácia em criar um vínculo emocional com o jogador através da música).Aliás, música é um fator tão importante no jogo, que uma banda de power jazz, os incríveis DCMC, onde um amnésico Duster toca baixo, tem uma participação importante na trama.E outra área em que o jogo é bem sucedido é na visual; os sprites dos personagens são grandes e coloridos, e o trabalho de animação destes é o melhor que eu já vi desde Suikoden 2(ou pelo menos eu reparei mais nisso porque esses sprites tem definição muito melhor no meu novo MONITOR FLAT SCREEN DE 19 POLEGADAS!!!!).E o design de monstros também é igualmente notável, com toda sorte de criaturas bizarras ou adoráveis (e ás vezes, esses dois juntos);com um destaque especial ás hilariamente grotescas Chimeras, que parecem ter vindo diretamente do Sea of Monsters.


Apesar de suceder nesses quesitos plásticos, existem algumas falhas menores que tiram um pouco do brilho do jogo.Por exemplo, o jogo apresenta um inventário com espaço limitado demais, tendo em vista a fartura de itens encontrados; muitos destes, em especial os itens de recuperar energia, ficam juntando poeira no inventário, já que os poderes PSI equivalentes á estes itens são muitas vezes bem mais eficientes (e custam pouco PP).Se você for daqueles que guardam os itens, pois nunca sabe quando se pode precisar deles, há pelo menos um modo de estocá-los, com o Sujeito Amigável dos Itens (tradução literal para Friendly Item Guy), mas ele não está sempre disponível por aí.Outro problema experimentado é um certo desequilíbrio nos combates, no que diz respeito aos personagens; Lucas, por exemplo, tem HP alto, pode usar PSI ofensivas e de cura, e é o personagem mais forte do jogo, enquanto seu cachorrinho Boney é fraco e tem apenas uma habilidade especial, analisar as fraquezas dos inimigos; considerando que durante a maior parte do jogo, o seu grupo consiste dois dos, mais Duster e Kumatora (que são meio-termo em utilidade, podendo usar, respectivamente, habilidades especiais de mudar o status do inimigo e PSI elemental), algumas batalhas mais acirradas, você vai acabar dependendo mais de uns personagens que outros, que acabam não servindo pra muita coisa.E enquanto o jogo não tem muitas batalhas extremamente desafiadoras, alguns encontros contra chefes exigem uma boa estratégia.


Existem outras falhas menores, mas a grande verdade á respeito de Mother 3 é que é um jogo em que existe tantos toquezinhos e cuidados bacanas em cada cantinho, que é impossível não ceder ao seu charme e humor pouco convencional, em detrimento das suas ocasionais decisões confusas de design.Simplesmente não dá pra passar por uma sessão de jogo sem encontrar um detalhe surreal ou engraçado (ou ambos), uma referência pop esperta, ou um momento de auto-referência inesperado.E isso afeta cada elemento do jogo, seja nos sapinhos que servem de save point e caixa automático (que aparecem nas mais diversas encarnações), na Rope Snake, um simples item que acaba virando um personagem surpreendentemente redondo, nos Mole Crickets, uma raça de honrados grilos guerreiros recorrentes ao longo do jogo, que por ironia são miseravelmente fracotes e tomam sonoras surras de Lucas e companhia, que depois se descobrem como prolíficos comerciantes, nos presentes (sim, ao invés de baús contendo itens, existem aqueles presentões de aniversário, estilo comercial de supermercado) que, ás vezes, em vez de darem um item, soltam fogos de artifício, ou tocam música ambiente.E claro, há momentos de humor surreal, como no contato com as "máquinas" de reabastecimento de oxigênio, ou na dancinha rebolativa que abre portas seladas magicamente de Wess, o pai de Duster.Mas certamente nada supera as Magypsies, seres místicos imortais, que ganham mais relevância com o desenrolar da trama.Em um outro jogo mais convencional, eles seriam certamente "village elders" ou outros velhinhos genéricos, mas não aqui; as Magypsies são personagens que tem características tanto do sexo feminino quanto do masculino, resultando numa composição visual um tanto, bem, peculiar.Mas o interessante é que esses personagens são construídos como carismáticos e bondosos o suficiente para simpatizar facilmente com eles.Não é o tipo de figura encontrada normalmente em jogos, especialmente numa mídia tão receosa em lidar com assuntos fora da zona de conforto daquele que a consome quanto os jogos eletrônicos, o que só serve como uma a validação das habilidades como escriba do Sr.Itoi.


Ele também soube não só criar situações pouco convencionais, mas como também apresentações questões provocativas á respeito da sociedade contemporânea em seu pequeno jogo; por exemplo, o jogo tem como tema principal o conflito entre a modernização e o progresso, e a natureza e a simplicidade, como evidenciado no logo (um tema especialmente emblemático porque vem do Japão, uma terra bem mais conhecida por seus avanços tecnológicos do que suas vastas florestas).Ao invadir as Nowhere Islands, primeiro os Pigmasks desmatam e fazem experimentos bizarros com os animais da região, e em seguida, iniciam uma dominação lateral, introduzindo os capiaus da vila de Tazmily á novidades tecnológicas, e um também á um certo "dinheiro", (vale lembrar que o jogador só começa a usar dinheiro pra se abastecer de itens a partir de certo ponto); é especialmente emblemático o capítulo onde o macaquinho Salsa deve correr pela vila entregando "Caixas Felizes" (na verdade, tevês de plasma rosa-choque) aos moradores do lugar.E razão desses literais "porcos capitalistas" fazerem tudo isso?Por que o seu mestre acha "legal".Qualquer paralelo com as justificativas infantis e simplistas que aceitamos nos nossos cotidianos tá valendo aqui (e só por motivos de contextualização, eu não sou um comunista frustrado ou um rejeitado da UNE; comunistas de verdade lêem Marx, reclamam da vida o tempo todo e enchem a cara de vodka de procedência duvidosa - e eu nunca li Marx, gente).E por falar nisso, o jogo tem em seu vilão outro grande acerto; esse personagem egresso de Earthbound, que aqui ganhou poderes e um exército pessoal, é um ególatra degenerado (espera até chegar no ambiente final do jogo, New Pork City, para ver isso), cuja existência também suscita a questão de se toda ditadura personalista não é também um pouco infantilóide.


Eu poderia ficar viajando na maionese até amanhã, mas eu já levei tempo demais pra escrever essa bodega; Mother 3 é um jogo recomendadíssimo para não só os fãs de RPGs japoneses, mas também aqueles que simplesmente curtem uma boa história recheada de humor surreal e nonsense, mas bastante esperto.Também é a chance de aproveitar a tradução direta da fonte, sem a interferência politicamente correta e castradora da Nintendo of America, que preserva piadas envolvendo bebida, duplos sentidos e humor negro, por exemplo, e alguns momentos incensuráveis, como a perturbadora alucinação dos cogumelos.Também, é um jogo que consegue emocionar o jogador sem resvalar na pieguice típica de muita ludodramaturgia oriental, recorrendo á temas familiares, nos quais é possível se identificar.E não se preocupe se você achar tudo isso muito estranho; como dizia minha antiga professora de literatura, tudo que, em maior ou menor escala, provoca um estranhamento em quem observa, é arte.