quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Mensagem de Ano-Novo (De Novo)



Pois é, mais um ano que se encerra, meus caros leitores, e como no ano passado, decidi redigir uma pequena mensagem congratulatória direcionada á vocês (sim, todos os nove) que acompanham este blog.Embora eu adoro listas e retrospectivas de final de ano, e eu tinha pensado em milhares de coisas para possivelmente escrever, agora subitamente eu vejo que estou sem a menor vontade de destilar calhamaços literários, até porque, ninguém vai ler isto até pelos menos o ano que vem.

Mas enfim, este ano, é bem notável que eu escrevi muito menos que no ano passado, quantitativamente falando.Sério, durante o ano, as análises aparecerem num ritmo mensal - quando apareciam(o que nunca foi minha intenção), o que pode deixar o acompanhamento do blog algo um pouco monótono para boa parte das pessoas que acessam a internet.Eu falo porque sou um desses necessitados por atualizações constantes; internet pra mim, especialmente durante esse ano, se tornou um vício maior até mesmo do que os meus preciosos jogos eletrônicos (sim, eu vou insistir em falar jogos eletrônicos-Games ou Videogames não cola pra mim, lembra demais denominação de catálogo da Casa & Vídeo).A maioria dos sites e blogs que eu visito tem atualizações em ritmo mais constante do que de mês em mês.Mas isso sou eu reclamando comigo mesmo, e não vai chegar a lugar nenhum.Principalmente porque, esse ano, as análises dobraram (como se dobra um número) de tamanho , ainda que tenham dobrado (como se dobra um papel) de quantidade.

Sério, eu fiquei sem tempo pra jogar, e consequentemente sem tempo pra escrever.Pra se ter uma idéia, eu iniciei uma série de textos com observações sobre narrativa em jogos no Gamecultura (que é de longe um dos melhores sites sobre jogos do Brasil), e consegui fazer as três partes que eu tinha planejado, mas falta a conclusão.Bom a última parte foi publicada, se não me engano, em agosto, e até agora eu não tive tempo/paciência/disposição para escrever o raio da conclusão.Acho que isso se deve ao fato de que o útlimo semestre foi algo atribulado para mim, ás voltas com o temido, famigerado e prolixamente adjetivado vestibular.Hã, não que eu tenha me matado de estudar, assim, mas o estresse que essas atividades envolvem (mais a escola, claro- Física e Química ainda são os nêmesis de qualquer estudante vagabundo que se preze) acabaram por me afastar deste blog que é meu hobby, preocupação constante e obsessão pouco saudável.Mas agora eu estou passado de ano, formado e saído da escola, então posso tratar de arranjar novas desculpas.

È claro que não foi esse o único motivo; não que a minha vida social tenha ficado interesssante o suficiente para também me afastar do blog (talvez em 2009 fique, quem sabe) ou influenciá-lo (se bem que teve uma análise que...ê, deixa pra lá), mas com certeza este ano foi bem mas, digamos, interessante que o anos passados.Ainda que de um ponto de vista puramente anedótico.Mas deixa pra lá.Mudando de assunto, o meu Wii finalmente começou a funcionar esse ano,(depois de praticamente um ano quebrado ou indisponível), e Twilight Princess é o melhor Zelda já feito, e Super Mario Galaxy pode ser um dos melhores jogos que eu joguei na vida.Mas eu não vou começar um blog pra falar sobre Wii, mesmo que eu tenha pensado em fazer isso anteriormente.Se eu mal consigo manter um blog, que dirá dois...

Mas atendo-se a assuntos pertinentes ao Gamer Atrasado, eu gostaria de agradecer a todos os meus leitores (sim, todos os nove), não só aqueles que se manifestam com comentários e e-mails (sério, isso conta muito pra quem escreve), mas também o leitor casual, aquele que só dá uma passada e gosta do que lê.Eu não mantenho um blog apenas para alimentar meu enorme ego, mas também para que as pessoas leiam, gostem, reflitam e joguem.Também gostaria de agradecer aos parceiros escritores de blog, como o Alex do (infelizmente finado) TV Retrô, que me deu uns toques sobre como blogar direito, e ao A.L.A.S, do Gameretrô, um ótimo blog, bastante semelhante ao meu no que diz respeito ao tema e tamanho e constância das postagens.Também queria desejar sorte para o pessoal da Colméia com o seu podcast de jogos.E, por fim, não posso me esquecer das adoráveis e voluptuosas moças do Ananas Métalliques, que insistiram o ano todo pra eu indicar o blog delas no meu, o que eu não pude graças á temática excessivamente feminina, o que poderia me constranger frente aos misógino público "gamer"(eu não sou muito afeito á esse termo, apesar de ele dar nome ao blog).Beleza, garotas, fiz o que vocês queriam.Agora, vocês estão me devendo aqueles favores sórdidos e impublicáveis que a gente tinha combinado.

Resoluções para o ano novo?Sei lá, eu não faço muitos planejamentos.Talvez, fazer postagens mais constantes, fazer um logo mais bonito pro blog no Photoshop(esta coisa que enfeita o "header" do blog foi feita em vinte minutos no Paintbrush- há um ano atrás), zerar Final Fantasy 7(embora acho que essa era uma resolução do ano passado, mas tudo bem), montar uma banda de rock, blues e músicas estranhas, começar a fazer jogos ao invés de meramente ficar escrevendo sobre eles.Ou quem sabe, tomar jeito na vida, arranjar um trabalho bem renumerado e criativamente estimulante, e uma moça bonita de olhos encantadores e personalidade cativante, e constituir família.Ninguém sabe o que o futuro nos reserva.

Hã, acho que me empolguei.

Feliz ano novo á todos.

sábado, 13 de dezembro de 2008

Harder, Better, Faster, Stronger

É uma reclamação comum nos dias de hoje que estamos recebendo (muito) mais sequências de jogos do que jogos originais.E é verdade mesmo; praticamente todos os grandes lançamentos dos últimos dois anos ou são continuações ou já tiveram as suas sequências anunciadas antes mesmo dos seus lançamentos.Por serem um investimento muito mais seguro para as grandes empresas de jogos, é normal que a sequências abundem, até porque, se mantiver a qualidade do jogo original (se ele tiver qualidade em primeiro lugar, claro) e trazer elementos novos, qual o problema, não é mesmo?Mas a verdade é que algumas empresas passam da mão no que diz respeito á originalidade, ou melhor, da falta dela.È o caso da Activision, que lança sequências de Guitar Hero e Call of Duty praticamente toda semana, e da Capcom, que só para ter uma idéia, já lançou mas de 50 jogos estrelados por robozinho azul Megaman.E, especialmente nesse caso, quando uma franquia é saturada desse jeito, o óbvio á pensar seria que os jogos perdem a qualidade individual, afinal, cada jogo é quase igual ao outro.Então, qual é a graça de analisar um jogo isolado nessa cascata de títulos indiferenciáveis?Bom, é o que vamos tentar descobrir.


Megaman X4 foi lançado para Sega Saturn e Playstation em 1997, é a quarta sequência da série Megaman X, que atualiza a série de ação 2D estrelada pelo robozinho azul com um novo ambiente futurista nipo-cyberpunk e excessos narrativos típicos de anime de qualidade questionável.A série é estrelada por X, que é basicamente o Megaman antigo com mais cara de mau, e Zero, um robô consideravelmente mais "cool", com uma armadura vermelha, sabre de luz e megahair louro que faria inveja em muitas apresentadoras de televisão.Zero foi, desde a sua introdução no primeiro Megaman X, um dos personagens mais adorados pelos fãs e justamente pela sua "coolzisse" de contraparte moralmente ambígua de protagonista (leia também:Shadow), que ele foi incluído pela primeira vez como personagem jogável neste episódio.Bom, já dava pra jogar com ele no terceiro episódio, mas ele ainda não tinha sua tradicional (e muito cool) espada-laser.A história de X4 não é muito diferente da dos outros jogos da série X: surge uma nova ameaça contra as pacíficas pessoas do ano 21XX, (apesar dos únicos habitantes conhecidos pelo jogador serem X, Zero, os robôs do mal -Mavericks- que eles caçam, e a pletora de coadjuvantes que só servem pra eventualmente se voltarem contra os heróis e serem destruídos também), aqui materializada na força militar Repliforce, que se insurge contra os Maverick Hunters após um mal entendido.Ou pelo menos é o que a história do jogo dá a entender, com seus diálogos mal-traduzidos e sequências em desenho animado, perdão, anime (não posso desagradar os otakus-metaleiros) bem feitinhas, mas horrendamente dubladas.


O jogo é estruturado como todos os Megamans anteriores (e posteriores): existem oito fases, cada uma com um respectivo robô como chefe final.Ao derrotar um desses chefes,é fornecido uma arma especial, de uso limitado, ao herói.Cada uma dessas armas é mais eficaz contra um determinado chefe, criando uma progressão de jogo ao estilo jo-kên-pô.É uma proposta de jogo interessante, pois, ao contrário da maioria dos jogos, a série Megaman começa muito difícil, e a medida que o jogador coleta armas e upgrades, vai ficando mais fácil até o seu final (em que a dificuldade sobe pra estratosfera de novo- os chefes finais da série Megaman são notoriamente difíceis, e aqui não é exceção).Essa estrutura de jogo também pressupõe uma certa repetição de algumas fases, até ser encontrada a melhor arma quanto ao chefe desta (a não ser que você olhe na internet a ordem dos chefes).Por isso, normalmente a série Megaman se segura mesmo no design das suas fases.E mesmo essas que fases sejam divertidas de serem jogadas algumas vezes, faltam aos níveis de X4 um pouco de originalidade.Praticamente todos os clichês do gênero (e da série Megaman) aparecem aqui; a fase do gelo com o piso deslizante, a fase de fogo com meteoros caindo do céu, a fase do elevador, a fase do trem...só faltou a fase do carrinho de mina(e por, mais jogos hoje em dia poderiam ter fases de carrinhos de mina).Ainda assim, existem elementos interessantes em algumas fases, como uma que testa as habilidades dos personagens e os premia pelo seu desempenho, num jogo dentro do jogo.A economia (ou ausência) de novas idéias se manifesta também nos chefes (que, apesar de terem visuais bacanas, continuam com nomes indefectíveis, do tipo, Web Spider) e nas armas ganhas, pois muitas destas imitam o funcionamento de armas de jogos anteriores.


E se alguns dos problemas permanecem os mesmos, as qualidades também; o que torna a série tão divertida (e possivelmente tão longeva), é a sua bem acertada jogabilidade, que mistura o tradicional run'n'gun da série como novas habilidades, como grudar nas paredes e executar "dashs" (que é basicamente um movimento de impulsão pra frente,que, tal qual o pulo duplo, é fisicamente impossível de ser realizado no nosso universo).Isso faz com que as fases sejam um exercício em reflexos, e obstáculos que inicialmente parecem dificéis de forma barata e forçada podem se tornar fáceis quando o jogador se acostuma com os recursos do controle.A verdade é que vários destes momentos de dificuldade barata e forçada foram simplesmente suprimidos do jogo; em comparação com os episódios anteriores, o fluxo das fases é mais polido e menos frustrante (alguém pode até dizer que o jogo é mais fácil, visto que alguns dos segredos ocultos nas fases, como Heart Tanks e Sub Tanks, são mais fáceis de serem encontrados que antes).Além disso, X4 tem algumas melhorias técnicas, como, por exemplo, a munição das armas especiais é recarregada toda vez que o personagem morre, e existe pelo menos um checkpoint em cada fase, evitando um pouco dessa tradicional rejogação de fases presente na série.


Mas o principal diferencial deste episódio (e talvez o único, para os observadores menos pacientes), é como dito antes, a possibilidade de jogar a campanha inteira como X ou Zero.Enquanto X pula, atira e coleta armas e upgrades para sua armadura, Zero tem um sistema de controle um pouco diferente; ele usa sua espada-laser para fazer combos de três golpes contra seus inimigos e, ao derrotar os chefes, ele não ganha novas armas armas, e sim novas habilidades e golpes, como uppercuts, rasteiras, e bem, pulo duplo.No geral, Zero é o mais divertido dos dois, visto que seus ataques são mais poderosos e dá a impressão que personagem é mais veloz.Além disso, com ele é mais fácil derrotar os chefes sem a habilidade correta (a relação jo-ken-pô ainda vale, ainda que um pouco, com ele), e estas batalhas ganham uma dinâmica semelhante aos jogos de luta, já que vale mais entender os padrões de movimento dos adversários e saber quando atacar ou defender, do que simplesmente atirar sem parar.Com X, uma vez encontrada a combinação correta entre chefe/arma, as batalhas não são nem mais um desafio, visto que alguns chefes são simplesmente paralisados pela arma correta.Mas fora isso, as aventuras dos dois personagens são exatamente iguais, com as mesmas fases e chefes (não, minto; existe UM chefe diferente para cada um).E mesmo que existam sequências animadas (muito mal dubladas mesmo )diferentes para cada um dos robôs, com direito á revelações interessantes sobre o passado de Zero, o fato de existiram duas campanhas separadas parece mais uma forma de aumentar artificialmente a longevidade do título, que é, por natureza, bem curto(Nos jogos subsquentes, só pra constar, se tornou possível alternar entre os dois durante uma única aventura).(Nossa, hoje eu estou exagerando nos parênteses).


No geral, não há nada particularmente errado com este episódio da série X; os gráficos são bonitos, as fases divertidas, as músicas agradáveis.Porém, a falta de ambição e a acomodação do jogo em não trazer nada novo fazem com que ele não consiga se distinguir dos outros episódios (tantos os que o antecederam quanto aos que o sucederam- a série X foi até episódio 8), ou deixar alguma impressão duradoura no jogador.Como os últimos dez anos demonstram, isso acabou por saturar a série, o que fez surgirem novos spin-offs (como a série de RPGs Battle Network e as aventuras solo de Zero- todas também devidamente saturadas com próprias toneladas de sequencias).Recentemente, toda a franquia deu uma invigorada com o lançamento de Megaman 9, que, com seus visuais 8-bit e glitches propositais, nada mais é do que uma (um pouco superestimada, a meu ver) volta aos princípios básicos que fundaram a série.Mas tal volta não seria necessária não fosse o estancamento criativo que a franquia sofreu ao entrar num esquema quase fordista de produção de sequências.E talvez X4 seja o seu exemplo mais emblemático disso.Não é um mau jogo; é apenas mais um jogo.

sábado, 8 de novembro de 2008

O Ébano e o Marfim

Algumas pessoas dizem que o mundo é dividido em pares de opostos; bem e mal, caos e ordem, certo e errado, causa e consequência.Não só esses opostos existem, como deve existe também um equilíbrio invisível entre eles, que esse o que segura o nosso universo inteiro.Bom, eu não sei se isso que eu estou dizendo faz muito sentido, ou se só estou fazendo uma introdução pretensiosa novamente, mas acho que todos nós sempre procuramos um pouco de equilíbrio em nossas vidas.Por exemplo, eu gostaria de fazer mais de uma análise por mês (invariavelmente próximo ao dia 15 de cada mês- não é proposital, mas é curioso), mas eu não tenho tempo pra zerar jogos ou escrever como outrora(eu estou tendo que lidar com o vestibular E as complicações típicas de final de adolescência, afinal).Mas o que eu tava falando?Sim, caos e ordem, equilíbrio universal.E se alguém resolvesse usar esses conceitos dentro de um jogo?(subam as cortinas logo, por favor...essas introduções ficam a cada análise mais complicadas)


Ikaruga foi lançado pela Treasure em 2001 para arcades, e depois convertido para Dreamcast e Gamecube (versão na qual essa análise é baseada – um viva para a primeira análise de GC aqui no GA!),e é a primeira vista parece mais um jogo de navinha (nada contra - afinal, eu adoro jogos de navinha).Mas certamente não é: primeiro, que é um jogo da Treasure, uma das desenvolvedoras mais criativas da indústria dos jogos (e responsável por alguns favoritos meus, como o superlativo Gunstar Heroes e Astro Boy:Omega Factor);segundo, é uma espécie de sucessor espiritual de Radiant Silvergun, um dos mais idolatrados jogos desse gênero (eu já joguei -semana passada- e é bom mesmo).Mas enquanto esse jogo contava com dúzias de armas diferentes, quase vinte fases e uma história grandiloquente, Ikaruga vai na direção contrária, apresentado uma mecânica elegante e minimalista, e uma narrativa mais sutil.O jogo tem uma história por trás sim, mas ela não aparece de nenhuma forma dentro do jogo, sendo só relatada através do manual do jogo.De qualquer forma, é o seu típico herói-solitário-contra-um-exército-do-mal, só que um pouco mais elaborado.Na versão japonesa, existiam pequenos textos entre as fases que desenvolviam um pouco mais a trama, mas isto foi cortado pela Atari (que publicou o jogo aqui no Ocidente).


Ikaruga é um jogo de navinha (ou shooter, ou schmup-aqui, é você quem manda!) com rolamento de tela vertical, e se você se lembra da análise de Einhander, sabe que boa parte desses jogos costumam bombardear o jogador com zilhões de balas na tela ao mesmo tempo, e cabe a ele desviar de todas.È lógico que Ikaruga tem momentos típicos de "bullet hell" (mas nada como esse jogo aqui), mas não é isso que o destaca, e sim a sua inteligente mecânica de polaridade.No mundo de Ikaruga, todos os inimigos são da cor preta ou branca, e seus tiros correspondem essa sua cor.Mas o interessante é que a sua nave pode, com o toque de um botão, trocar entre essas polaridades, podendo atirar e absorver tiros de uma das polaridades; logo, a nave só é destruída se for atingida por um tiro de uma polaridade oposta, ou colidir com o cenário.Os tiros absorvidos carregam uma barra de energia no canto da tela, que indica o quão carregado está o seu tiro especial:esse tiro funciona mais ou menos como aquelas bombas que explodem tudo que está na tela:ao acioná-lo, a sua nave dispara uma série de mísseis teleguiados, que servem para livrar o jogador de situações mais complicadas.Além disso, os tiros de uma polaridade causam o dobro de dano em inimigos da polaridade oposta, adicionando uma nova camada de estratégia á um jogo que já é bem complexo.


A pontuação também é dada de forma diferente em Ikaruga; ao contrário da maioria dos schmups, onde cada inimigo abatido fornece uma pontuação, neste a cada três inimigos da mesma cor abatidos, o jogador faz uma "chain", e a cada nova "chain", mais pontos são fornecidos,até uma chegar a "MAX chain".Também, absorver balas da polaridade da sua nave também fornece alguns pontinhos.Então, para se dar bem em Ikaruga (já que uma determinada quantidade de pontos fornece uma vida extra), é necessário estratégia e cautela.Não que não seja possível sair atirando desmioladamente em tudo que passar (é até uma estratégia bastante válida em alguns momentos), mas se você quer jogar direito, é melhor começar a decorar os padrões de aparecimento dos inimigos(o que acaba por acontecer naturalmente, depois de um tempo).E é aí que chega um ponto crucial de Ikaruga:para inciantes ou veteranos, é difícil pra caramba.Sim, eu já falei isso de alguns jogos aqui no blog, mas sobre este, eu estou falando sério.Aqui a curva de aprendizado tá mais para pirambeira de aprendizado, de tão íngreme.Porém, uma das características mais curiosas deste título é que a dificuldade é sim, vencível (eu gastava quatro continues para passar das duas primeiras fases quando comecei a jogar, e agora eu gasto no máximo três vidas), parte porque o jogo é tão brilhantemente pensado, que, conforme o jogador vai se acostumando com as mecânicas e os desafios, e aprendendo novos truques, tudo vai se tornando orgânico, e cada vez mais divertido.


Vejamos bem, o gênero dos jogos de navinha é esnobado por alguns gamers justamente por sua característica definidora, a simplicidade.Mas essa simplicidade justamente é o que diminui a distância entre o design e o jogo propriamente dito, o que permite o designer pirar nas idéias e fazer algo realmente notável.E talvez nenhum jogo exemplifique melhor isso do que Ikaruga.Cada onda de inimigos de uma cor aparece na mesma proporção que os da cor oposta, o que permite criar chains com precisão matemática; cada momento do jogo apresenta uma combinação nova de inimigos e tiros, mas mesmo assim o equilíbrio entre eles é preservado.E cada uma dessas situações parece ter uma estratégia por trás, que se desvendada,permite ao jogadores ganhar grandes quantidades de pontos.Não por acaso, o desenvolvimento do jogo (que é relativamente curto,tendo apenas cinco fases e podendo ser zerado em menos de meia hora) consumiu dois anos inteiros, uma eternidade para um jogo de navinha.E esse capricho não faz se sentir só no design, como também nos gráficos e no som; apesar da jogabilidade ser essencialmente 2D, todos os modelos são em 3D, bem como os cenários ao fundo.Também, alguns dos padrões de bala são hipnotizantes quanto mortais (segunda e quarta fase, se quer exemplos).Além disso, como todo schmup que se preze, Ikaruga também conta com uma trilha sonora de alto calibre, que não enjoa mesmo depois de jogar o jogo centenas de vezes.


O leitor atencioso já deve ter notado que repetição é grande parte da experiência do jogo, é embora isso não seja negativo, porque é como o jogador vai ganhando habilidade; mesmo assim, existem três modos de dificuldade diferentes, Fácil, Médio, ou Difícil, que ao contrário do que se poderia imaginar, não deixam o jogo fácil, médio, ou difícil;no modo Fácil, destruir inimigos não provoca nada, enquanto no Médio, destruir um inimigo da mesma polaridade da sua nave joga uma série de balas da mesma polaridade na sua direção, e por fim, no Difícil, todo inimigos destruído lança uma chuva de balas contra você.Embora para os iniciantes, o melhor seja jogar no modo Fácil, o jogador um pouco mais experiente vai ter mais facilidade com o Médio, pois nesse, as balas liberadas dão um bônus considerável para sua pontuação, além de manter o seu super-raio-que-destrói-tudo sempre carregado.Por essas e outras que os jogadores mais aficcionados por Ikaruga se esforçam para dominar o jogo em todos os modos.


Felizmente, a versão de console oferece uma série de opções para treinar e refinar suas habilidades no jogo, como as opções Conquest, que permite rejogar seções curtas das fases e ver demonstrações de como jogar essas seções, e Practice, onde se pode jogar fases inteiras em diferentes níveis de dificuldade.O problema é que as fases só são liberadas para esses modos ao chegar nelas com apenas um continue (o que, desnecessário dizer, é ridiculamente difícil).Além disso, existem extras a serem liberados (como arte conceitual, teste de som e o Prototype Mode, que consegue deixar o jogo ainda mais esculhambadamente difícil)para aqueles que conseguirem zerar o jogo sob certas condições, ou jogar por um determinado número de horas.Aliás, a cada hora de jogo registrada, o jogador ganha um continue extra para usar no jogo, até que se ele alcança 8 horas, ganha continues infinitos (o chamado modo Free Play), permitindo que todo mundo consiga chegar até o final do jogo.O único problema disso talvez seja que, uma vez com o Free Play liberado, é impossível desativá-lo, o que impede o jogador mais egocêntrico de exibir suas técnicas para os seus amigos.E falando em amigos, Ikaruga também tem suporte para dois jogadores, que é tão divertido (e mais competitivo) quanto jogar sozinho.


Mas aqueles que enxergarem Ikaruga apenas como um desafio dos brabos provavelmente não vão conseguir o simbolismo mais profundo que existe em suas entrelinhas.O observador um pouco mais perspicaz vai logo perceber que o jogo é cheio de imagens que evocam a filosofia oriental, como o Yin Yang(veja o chefe da segunda fase), que representa os pares de opostos em equilíbrio no universo; além disso cada uma das cinco fases do jogo (Ideal, Julgamento, Fé, Realidade e Metempsicose) são nomeadas com base nas etapas que a humanidade deve ultrapassar para alcançar a iluminação.Seguindo essa linha de pensamento, a sua nave representaria justamente o ser humano, constantemente mudando a sua "polaridade" para entender o mundo a sua volta e se adaptar aos seus desafios.O citado equilíbrio entre os inimigos de ambas as cores, além de diversos momentos no jogo que podem ser metaforizados pelos com maior capacidade de abstração que eu, servem para confirmar essa idéia.Por fim, a dificuldade algo exacerbada do jogo explicita a sua complexa mensagem,a da dificuldade que é encontrar o equilíbrio e a calma em meio ao caos.


Mas e se existe uma falha neste jogo, com certeza é a sua dificuldade.è certo que um jogo mais fácil perderia um pouco da sua força simbólica, e também o jogo é bem feito o suficiente para nenhuma das mortes darem aquela sensação barata de "o jogo roubou".Mas essa dificuldade exige que o jogador realmente se dedique, pense em estratégias e não se frustre com facilidade, já que até conseguir algum domínio no jogo, ele irá morrer muito (a não ser que ele seja como aquele demente que consegue jogar com duas naves ao mesmo tempo).Depois de um tempo, quando o jogador já conseguiu continues infinitos, o desafio passa a não ser mais zerar o jogo, e sim conseguir a melhor performance, com mais pontos e vidas.Nisso, alguns jogadores podem se ver desestimulados, pois o objetivo é menos recompensador e o aprendizado é árduo.E francamente, a vida é muito curta pra ficar se dedicando tanto á um jogo.Além disso, a dificuldade poderá espantar aqueles que se poderiam se interessar pela força simbólica, e mesmo pela experiência quase espiritual que é o jogo, o que restringe suas possibilidades.Dito isso, sempre haverão os jogadores mais fanáticos, aqueles que realmente irão se divertir ao melhorar, degrau por degrau, sua perícia no jogo.Quanto ao resto dos mortais,a única recomendação que fica é que o consumo exagerado de álcool pode melhorar a técnica e os reflexos do jogador incauto em Ikaruga (Hã, não que eu tenha testado isso.Não, sério, não!)


Apesar dos pesares, Ikaruga é um dos jogos de navinha mais famosos e populares entre, bem, as pessoas que jogam jogo de navinha, e se tornou ainda mais reconhecido com o seu relançamento na Xbox Live, a rede de download de jogos do Xbox 360, que conta com um competitivo scoreboard online para os fissurados.Além disso, os muitos fãs do jogo já prestaram diversos tributos ao jogo, como um remake feito em Game Maker, e um outro feito com gráficos de Atari.Apesar de todo esse culto, a Treasure mantém a boca fechada quanto á uma possível sequência, apesar do ressurgimento da popularidade desse gênero.Por isso, Ikaruga ganha aquela certa aura de unicidade (eu não sei se essa palavra existe) no panorama dos jogos, se erguendo não por seus gráficos ou marketing em sua volta, e sim pela força inabalável do seu design.È um jogo a ser respeitado, mesmo que ele não respeite muito você...



(E o título dessa análise não é de jeito algum uma referência á essa música. Até porque, essa música é terrível,).

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Um Ninjinha do Barulho

Há muito, muito tempo atrás, lá nos anos 90, a cena gamística não era dominada por caras mal-encarados, cenários monocromáticos e minigames de sacudir controle como hoje.Não, nessa época, as "gimmicks" eram outras, e o que estava realmente na moda eram bichinhos antropomórficos cheios de uma certa "atitude" característica dessa época.O gênero dos mascotes, como eram chamados, redeu ao mundos jogos realmente bons, como os da Sonic e Ristar, mas também renderam babas das quais hoje pouca gente se lembra, como Bubsy e Aero the Acrobat.Pois então, lá pelos idos de 1998, quando parecia que a moda dos mascotes estava passando para dar lugar á moda dos protagonistas andróginos e misantropos, uma certa empresa resolveu pegar o bonde, e fazer com a sua assinatura típica, um autêntico jogo de mascotes (mesmo sendo ela a principal responsável por essa mudança).


Brave Fencer Musashi foi lançado para o Playstation em 1998 pela Squaresoft, e se faz diferente da maioria dos jogos lançados pela empresa por não ser um RPG tradicional.Tá, não é a primeira vez que o povo da Quadrado-Macio faz isso, e até porque, o jogo não está tão afastado assim das convenções do gênero.Na verdade, Musashi é uma mistura de RPG com plataforma com ação com aventura, uma dessas misturebas típicas da indústria de jogos, que ás vezes resulta num prato indigesto.Felizmente, esse não é o caso aqui, pelo menos na maioria das vezes.O jogo conta à história do ninjinha/samurai (perdoe a minha ignorância á respeito da cultura oriental) Musashi, que é invocado por uma princesinha mimada e sua corte de desajustados (que incluí um senhorzinho de uns 200 anos e um bibliotecário afeminado), para combater o império do mal de Thirstquencher de invadir o pacífico reino de Allucaneet, e parar de aprisionar seus igualmente pacíficos habitantes em cristais de um mineral fictício boladão denominado Binchotite.A princesinha patricinha esperava invocar o nobre guerreiro que havia derrotado o Mago das Trevas há anos, mas ao invés disso, acaba invocando um garotinho pentelho.


Se a história parece um pouco boba, é porque você a está levando a sério demais.Se a dublagem tosca, mas nem por isso menos engraçada, já não denuncia, o jogo adota um feeling meio "Sessão da Tarde", meio "muita confusão", invocando a citada estética dos mascotes, o que se pode perceber no design dos personagens e nos diálogos adoravelmente bobos.Quer dizer, sendo um jogo de plataforma (gênero em que os mascotes predominam), talvez essa é a decisão estética mais adequada.Mas enfim, além de um ou outro "twist" meio absurdo na história, ou a introdução de um novo personagem peculiar (eu fiquei surpreso com a quantidade de personagens que esse jogo tem, visto que eles aparecem pouco durante a aventura), a história transcorre sem maiores surpresas.Uma curiosidade é que o jogo é livremente (e bota livremente nisso) inspirado na vida de Miyamoto Musashi, um famoso espadachim japonês, como se pode perceber na presença do rival dele, Sasaki Kojiro, ou no fato da sua busca envolve achar cinco relíquias místicas (o Musashi de verdade escreveu O Livro dos Cinco Anéis, onde detalha suas técnicas de combate e filosofia).Como se vê, o espadachim é parte do folclore japonês, portanto, um jogo eletrônico feito no Japão onde ele é reinterpretado como um moleque falastrão não é tão estranho quanto se fizessem aqui no Brasil, sei lá, uma pornochanchada sobre Xica da Silva.


Comparações socioculturais á parte, a jogabilidade de Brave Fencer Musashi é bastante sólida na sua combinação de estilos.Um dos destaques do jogo são as muitas habilidades que Musashi vai adquirindo ao longo da jornada.Além de começar com um ataque fraco e um forte (representando as duas espadas diferentes que ele carrega, Fusion e Lumina) e a óbvia habilidade de pular, o fedelho tem a habilidade de absorver poderes dos inimigos (no melhor estilo Kirby) lhes arremessando a espada Fusion, fazendo um barulhinho que um amigo meu apelidou distintamente de "Pichuon".Cada inimigo fornece a ele uma habilidade diferente, que vão desde poder atirar balas psíquicas e saltitar fazendo a espada de pula-pula até se transformar em metal e atirar mísseis teleguiados.Com o prosseguimento da história, Musashi vai encontrando "scrolls" (que na verdade pouco tem a ver com pergaminhos, mas a culpa é da tradução, não minha) que também lhe conferem habilidades, essas mais relacionadas á exploração do cenário do que combate, como causar impacto no chão para derrubar pedras, soltar fogo para acender tochas e até caminhar sobre a água.A ainda há peças de uma certa "Legendary Armor" para serem encontrados, cada uma conferindo, naturalmente, uma nova habilidade á Musashi, como poder escalar paredes e o indispensável pulo duplo.


Apesar disso, o jogo não faz tanto uso das múltiplas possibilidades que essas habilidades concedem.A primeira fase do jogo, que apresenta um caminho linear cheio de inimigos, pulos e o eventual puzzle, pode enganar o jogador, o fazendo pensar que é um jogo estruturado em fases.Na verdade, logo acabando essa etapa introdutória, o jovem Musashinho é levado á uma vila, e passará a maior parte do jogo explorando ela e seus arredores, e realizando missões para seus habitantes.Isso configura um mundo bastante pequeno para explorar, com as novas áreas que são liberadas ao longo do jogo todas sendo muito próximas da vila, o que acaba constituindo uma experiência linear.Mesmo assim, o jogo apresenta variedade nas missões e desafios propostos, com direito á alguns minigames para quebrar a monotonia (como um completamente inesperado minigame de dança no final do jogo), com seções de plataforma criativas e surpreendentemente desafiadoras.O problema é que, talvez com a intenção de prolongar artificialmente a longevidade do título, o jogo tem a mania irritante de forçar a rejogar certar seções, com poucas ou muitas vezes nenhuma alterações.O que é uma pena, pois as etapas onde surgem desafios novos são muito bacanas, fazendo uso das muitas habilidades do versátil pivete.


Além dos elementos de plataforma já citados, Brave Fencer Musashi também tem leves elementos de RPG.Leia-se:números pipocam quando você acerta seus inimigos.Musashi tem quatro atributos básicos, mas estes atributos não são elevados ao derrotar inimigos e ganhar pontos de experiência, e sim cada um é elevado de uma maneira particular, seja atacando os inimigos com as duas espadas ou simplesmente andando por aí.O personagem também tem uma barra de energia e uma de mana (aqui denominada "Bincho Points", gastos ao usar as habilidades absorvidas dos inimigos), mas elas também são evoluídas de modos igualmente arbitrários:os Bincho Points aumentam ao libertar as pessoas presas nos cristais, e a energia é aumentada ao achar criaturinhas estranhas chamadas Minku, que só aparecem em determinados locais e em determinadas horas.Como os cristais aparecem com mais frequência que os Minkus, a tendência ao final do jogo é haver uma certa disparidade entre os dois atributos(A menos que o jogador seja obsessivo por sidequests).E falando em determinadas horas, o jogo também tem um sistema de dia e noite, que provoca algumas mudanças no cenário (a iluminação e a trilha sonora muda de acordo com o horário, o que devia ser bem bacana há dez anos atrás) e as lojas da vila fecharem.Apesar de alguns eventos só acontecerem em determinados horários, não é o suficiente para tirar desse sistema de dia e note o aspecto cosmético.Outro detalhe importante é que Musashi precisa descansar entre as suas aventuras, se não irá ficar cambaleando sonolento, o que pode ser feito na estalagem da vila ou no castelo de Allucaneet.Tal e qual como o sistema de horário, esse "fator tamagotchi" também não acrescenta muita coisa, aliás, até atrapalha em certos momentos do jogo.


A duração de Brave Fencer Musashi é um pouco curta, pelo menos em comparação á RPGs típicos, e as sidequets não são lá muito numerosas.Como dito, o ambiente de jogo é meio pequeno, e como o próprio jogo já força o jogador a rejogar certas fases, não sobra muito estímulo para passar de novo pelos mesmo cenário.Fora que, em algumas situações, o jogo simplesmente não informa qual é o próximo lugar para onde ir (mas isso também é um pouco típico dos RPGs nipônicos e seus derivados).A dificuldade também é um pouco desequilibrada, porque algumas seções são moleza, enquanto outras arrancam muita vida sem o jogador nem reparar (malditos poços sem fundo!).È lógico que dá pra se encher de itens de recuperar energia, mas o inventário ás vezes tem pouco espaço para tais itens (ainda mais quando este é ocupado com itens indescartáveis), e algumas etapas realmente forçam a mão na arrancação de HP (como nas-sensacionais!-batalhas contra chefe).E como um comentário completamente irrelacionado com a corrente temática do parágrafo, a trilha sonora de Brave Fencer Musashi é verdadeiramente impressionante, digna de entrar no hall das minhas trilhas favoritas, especialmente se considerando que o jogo podia ser recheado de melodias chatinhas, dado á sua temática.Ao invés disso, o jogo tem uma trilha marcante, cheia de melodias belas e elaboradas (o que é uma marca na maioria dos jogos da Square, verdade seja dita).


Brave Fencer Musashi provavelmente não é um jogo para todos; a apresentação levemente (e intencionalmente) infantil e algumas das mecânicas um pouco datadas podem afastar os jogadores.Mas o jogo tem carisma, boas idéias e referências culturais deslocadas o suficiente para agradar quem gosta de RPGs de ação.O jogo, apesar de não ser muito popular a época (afinal, competia com um jogo um pouco semelhante, chamado Ocarina of Time- e aliás, num exercício de especulação, pode-se argumentar que Brave Fencer Musashi seria o que se teria tornado esse jogo se Zelda 2-The Adventure of Link, tivesse ditado os rumos da série) até recebeu uma sequência para o PS2, mas que não foi lá muito bem recebida pela crítica.Ou seja, o jogo original é melhor.No geral, no Playstation Velho podem existir melhores opções de jogos de RPG, podem existir melhores opções de jogos de plataforma, mas eu duvido que exista uma melhor opção de RPG de plataforma disponível por aí.Em qualquer console.


(Sabe, de vez em quando é bom escrever análises mais curtas e menos filosóficas, só pra dar uma variada...)

domingo, 14 de setembro de 2008

Vidas pela Metade

Uma das maiores dificuldades de ser um gamer atrasado com certeza é lidar com o hype, ou em bom português, a expectativa.Jogar um jogo que absolutamente todo mundo já jogou alguns anos depois do seu lançamento, depois de ter lido centenas de artigos proclamando que este ou aquele é o "Best game EVAAAR!", e se desviando habilmente dos spoilers que podem estragar a experiência futura, faz cair uma atmosfera de expectativas sobre ele, que podem ás vezes contaminar a própria opinião de quem joga.Mas, porém, contudo, contanto e todavia, a tarefa de quem analisa um jogo é justamente se isolar das influências e expectativas externas, para ver se consegue exprimir uma opinião decente.O que não vai ser muito fácil, visto o naipe do jogo em questão.


Half-Life 2 foi lançado para PCs no final de 2004 pela Valve , e é a sequência do universalmente aclamado Half-Life (que também é um dos meus jogos favoritos, diga-se de passagem- o analisador tem um pezinho no caldeirão do hype mental em relação ao jogo), e provavelmente é um tipo diferente de jogo do que estamos acostumados a ver aqui no blog; primeiro, ele não foi um fracasso de vendas ou é desconhecido, e segundo, não é nem tão antigo assim.Mas dá pra eu justificar essa última, j que como todo mundo já jogou esse jogo (eu faço questão de ressaltar), está mais do que adequado na classificação de "atrasado".E de qualquer forma, depois de ter terminado um jogo desta magnitude, dificilmente eu deixaria de falar sobre ele.


Half-Life 2 abre com uma das sequências iniciais mais interessantes dos últimos anos; o jogo parte do ponto em que o primeiro parou (caso você não lembre- ou não tenha jogado, que feio!-, no final do primeiro, Gordon Freeman, o herói de ação barbudo e cientista nas horas vagas, havia sido paralisado no tempo e espaço pelo enigmático homem de preto G-Man, após ter destruído um alienígena gigante grotesco), com G-Man acordando o herói do seu "sono" e explicando, através de um monólogo com closes desconfortavelmente próximos, que precisa novamente dos seus serviços.Então, Gordon (e o jogador, com quem este partilha a visão) surge dentro de um trem, aproximando-se de uma estação, e lentamente se dá conta do que aconteceu: o planeta aparentemente se tornou uma distopia soturna, após ser dominado por uma sinistra raça extradimensional mascarada, os Combine, os cidadãos andam todos de cabeça baixa em indistinguíveis uniformes azuis, câmeras flutuante tiram fotos de todos os passantes, e um tiozinho de cabelos brancos, Dr. Wallace Breen, discursa incessantemente sobre como os humanos deveriam aprender a reprimir seus instintos e se sentir gratos aos "benfeitores" Combine em telões onipresentes pela estação.George Orwell ficaria orgulhoso.Mas logo, o jogador vai se reunir com um velho conhecido do primeiro jogo, e após uma impressionante sequência de perseguição, o jogo irá começas de verdade.


Chega a ser desnecessários discutir como a narrativa em Half-Life 2 é bem implementada é criativa; o jogo se vale da visão em primeira pessoa para, assim como o primeiro jogo, criar uma experiência contínua sem intermissões de filminhos ou sequer telas especiais de loading (ainda existem loadings, vale lembrar- e alguns deles são bem demorados).A história se desenrola com as animações dos personagens e situações acontecendo em tempo real, com o jogador podendo acompanhar do jeito que lhe interessa.A interface do jogo também ajuda nisso, pois não é manchada por nenhum ícone além dos sóbrios indicadores de energia, armadura e munição.Está tudo aí para manter o jogo o máximo possível imerso na experiência do jogo.Principalmente porque, depois de que Gordon esculhamba com dois guardas Combines com seu famoso pé-de-cabra e tem acesso á sua primeira arma, o jogo se lembra que é um FPS (first person SHOOTER) e se transforma em uma montanha-russa de ação até o seu final.E essa comparação não está aí só para efeito de hipérbole; Half-Life 2 adota uma postura relativamente minimalista no que diz respeito ao seu design de níveis (não há bifurcações, salas secretas, itens escondidos, sidequests ou finais secretos) e faz miséria com a linearidade.Ao invés de dar a liberdade máxima ao jogador, o que parece ser a principal tendência de design de jogos nos últimos anos (como já vimos aqui), o jogo faz exatamente o oposto: o conduz por um único caminho apenas (e visto que o jogador passa por cenários vastos em muitos momentos, isso evidencia o esforço do povo que faz o design de níveis na Valve), jogando toda a sorte de desafios no seu caminho.Isso poderia ser alvo de críticas dos jogadores mais ranzinzas, mas isso é uma abordagem que permite um controle maior dos criadores do jogo sobre a experiência do jogador.Se por um lado, todos os jogadores vão ter a mesma experiência, ela provavelmente vai ser incrível para todos eles.


Mas essa restrição da liberdade do jogador provavelmente condenaria o jogo se ele, como a maioria dos FPS, se restringisse á tiroteios contra inimigos comandados por uma AI meia boca.Mas Half-Life 2 tal como seu predecessor, esbanja uma variedade de situações criativa de jogo.No primeiro HL, ás vezes era necessário ativar uma máquina para fazer churrasquinho de uma criatura gigante que habitava um poço para poder cruzá-lo, atravessar uma fase num trenzinho, pular de esteira em esteira numa máquina gigante e enfrentar marines num cânion.HL2 além de introduzir dúzias de desafios novos, como fases de combate de esquadrão e fases onde se controla um exército de insetos gigantes, também apresenta novos inimigos (como os soldados Combine,uma variedade venenosa de headcrab, novos tipos de zumbi, e um bizarro helicóptero orgânico), fases de veículos com controle surpreendentemente bom, e os famigerados puzzles de física.Não, Gordon não deve calcular a força de atrito ou a resistência elétrica de algum objeto para prosseguir; ele deve por exemplo, colocar peso numa gangorra improvisada para levantar uma passagem, ou usar barris cheios de ar para levantar uma ponte.Esses puzzles, porém, dificilmente seriam tão intuitivos se o jogo não fizesse uso da poderosa Source Engine.


A Source Engine, que fez a sua estréia nesse jogo (bom, falar a verdade foi no Counter Strike:Source, mas para efeito de simplificar a leitura, vamos esquecer esse fato.), é o que dá o tempero especial á interação com os cenário no jogo;aqui, os objetos e o cenário reagem de forma realística e impressionante, e é possível carregar e tirar de lugar praticamente qualquer coisa no ambiente de jogo.HL2 tinha a missão de demonstrar do que a Source, desenvovida pela Valve, é capaz (mas felizmente não se ateve a ser apenas um showcase tecnológico, ao contrário do que faz a série Unreal Tournament), e a melhor forma de fazer isso foi com a introdução de um aparelhinho que testa todo o poder desta engine: a arma de gravidade.Ao contrário das outras armas do jogo, esse trambolho não funciona com munição, e sim com pedaços do cenário; ela pode capturar objetos, que vão desde pedaços de escombros até os mais mortais barris explosivos, e os arremessar longe (de preferência, em cima dos inimigos).Não apenas usá-la para bagunçar o cenário é extremamente divertido, como também é importante saber utilizá-la para resolver alguns dos puzzles de física e combater os inimigos.Sem contar que, na fase final do jogo, ela ganha um upgrade que torna as coisas ainda mais caóticas (e divertidas).Outro detalhe técnico do jogo que salta á atenção são os impressionantemente realistas movimentos faciais e animações dos personagens, bem como a sincronia labial.Isso se deve ao fato de que pessoas de verdade foram usadas como modelo para os personagens (como parentes dos funcionários da Valve), e não apenas para a captura dos movimentos.


Mas ser competente nos aspectos técnicos é via de regra em todo jogo-blockbuster-mastodonte de sua época.Mas HL2, além disso, também conta com uma direção artística surpreendente e original.Enquanto o primeiro jogo se passava quase todo num grande complexo científico (com um epílogo num planeta alienígena), Half-Life 2 se passa na metrópole City 17, que tem uma inspiração arquitetônica claramente inspirada em cidades do Leste Europeu, apesar do jogo em momento algum dizer qual é a localização geográfica do lugar (e eu não sou o único que acha isso).Mas o jogo também passa por outras locações memoráveis, como o bairro infestado de zumbis Ravenholm (que também é a melhor fase do jogo, um nível assustador que traz referências visuais dos filmes de George Romero, e onde você é auxiliado por um padre biruta que usa All-Star), uma labiríntica prisão, e a torre gigantesca que domina a paisagem de City 17, Citadel, cujo interior com visual de pesadelo tecnológico parece ter saído de uma capa de CD do Pink Floyd.No departamento sonoro, o jogo também traz uma abordagem nova; ao invés de ter músicas de fundo que ficam no loop perpetuamente durante o jogo, as músicas (excelente, por sinal) entram em determinados momentos para acentuar o drama da situação.Enquanto isso, as inspiradas dublagens e os efeitos sonoros são competentes, como seria de esperar.


A mudança temática do jogo em relação ao seu predecessor fez muito bem ao jogo no que diz respeito ao desenvolvimento da trama; enquanto o primeiro jogo tinha um tom subliminar de sátira de humor negro ao suposto caráter milagroso da ciência (o próprio nome do jogo, Half-Life, indica o termo científico sobre o tempo que uma substância leva para se decompor até a metade de sua massa. Ei, estudar Química ás vezes ajuda á escrever análises), o segundo jogo tem um arco temático muita mais ampla, pois lida, principalmente, com o tema da liberdade.Gordon Freeman, durante sua ausência, ganhou um status de figura messiânica, e a sua volta vai acabar por inspirar os cidadãos de City 17 a se erguer contra os seus opressores, opressores esses que não só os privam de suas liberdades, como também as caracterizam como desnecessárias.O nome Freeman (o Homem Livre) aqui ganha uma forte conotação simbólica, o que não deixa de ser irônico, já que, além da própria estrutura do jogo ser sumamente linear, como já foi explicado, há sempre a sensação de que, como no primeiro jogo, cada passo seu na verdade foi orquestrado pelo G-Man (coisa que o final do jogo faz questão de indicar).O protagonista, o jogo parece sugerir, jamais poderá alcançar a total liberdade, pois sempre vai estar sob o controle restritivo de alguém - seja um homenzinho estranho de terno, seja de um sujeito atrás de um mouse e um teclado.


E Gordon Freeman talvez seja o protagonista ideal para esse conflito, justamente pelo jeito de que a sua caracterização na história é feita.Como a narrativa do jogo é contínua, nunca saindo dos olhos do doutor Gordon, e não há sequer um espelho onde possa se enxergar a sua face, não há nada que indique que o ele é realmente aquele sujeito barbudo e de óculos que a embalagem do jogo e as imagens promocionais apontam que é.Mas então, qual é a utilidade da criação desta figura?Bom, além das óbvias dificuldades publicitárias de se promover um jogo eletrônico sem um protagonista de imagem concreta, eu pessoalmente acho que a chave disto está na identificação com o personagem; a escolha da imagem de Gordon como próxima á de uma pessoa comum, um típico "everymen", ao contrário a dos típicos machões bombados que povoam os jogos em primeira pessoa, parece mais adequado para um jogo com um protagonista "invisível", pois cria uma familiaridade e simpatia reais com um sujeito que não dá um pio durante o jogo todo.Por isso, os conflitos enfrentados por ele tornam-se próximos o suficiente do jogador, mas sem aliená-lo transformando que o próprio jogador no personagem em questão.E se o jogo consegue realizar um elo emocional com um sujeito que nem se vê a cara, é claro que ele também consegue com os personagens palpáveis, e em especial, com aqueles que acompanham o jogador durante a aventura, como o robô com alma de cãozinho Dog, Barney Calhoun, seu amigo soldado dos tempos de Black Mesa, e Alyx Vance, com que você acaba passando mais tempo durante a aventura, e sai dela com o personagem mais bem realizado.O jeito como a personagem é construída se revela mais um dos acertos da narrativa, pois é o convívio com ela, suas frases espertas e os olhares trocados que compõe a sua personalidade em pequenas doses, e fazem com que o jogador realmente se importe com ela, não apenas como um atirador extra, e sim como uma companheira.A aposta dos desenvolvedores nessa empatia com a personagem é tanta que é a preocupação com Alyx que se torna o grande gancho do final do jogo.


Final este que é um pouco desapontador, pois, apesar de se dar de uma forma completamente surpreendente, é parecido demais com o do primeiro jogo para o bem da originalidade.Além disso, ele não é conclusivo o suficiente para satisfazer quem gostou da narrativa do jogo (talvez para deixar um gancho para as sequências episódicas de HL2), especialmente porque muitas perguntas -bem, praticamente todas- permanecem sem respostas.O que não deixa de ser um pouco chato, pois algumas sequências de tiroteio durante o jogo, por mais bem realizadas que sejam, podem ser um pouco tediosas depois que você mata o milésimo combine.Se houvesse um equilíbrio melhor entre as seções de história e de ação pura e direta (coisa que foi alcançada de forma mais eficaz nas já citadas sequências episódicas - especialmente no sensacional Episode 2), o jogo poderia ser melhor ainda.Mas o jogo se dispõe atender não só as necessidades dos nerd-artísticos-intelectuais-metidos-á-besta, como também do pessoal do Winguélevi, Gêtêá, e Cóuterstriqui, ou seja, tá lá atrás de ação pura e direta mesmo, sem essas frescuras de historinha.E é esse pessoal que faz a indústria do jogo girar, até porque eles compõem boa parte dos jogadores.E é esse tipo de conservadorismo que enclausura os jogos eletrônicos na ótica simplista com que são visto pelo mundo não-gamer.São os próprios jogadores os responsáveis por essa imagem negativa, "esmaga-botão", porque eles mesmos não realmente acreditam que os jogos podem ser mais do que apenas passatempo.Sério, eu não tenho nada contra ação desenfreada e nem aos jogos citados, mas pessoalmente acho que os jogadores poderiam ser um pouco mais receptivos á jogos um pouco diferentes do normal.

Se todas as minhas análises continuarem terminando nesse tom panfletário-confessional, que vai acabar precisando de análise sou eu.Ai, ai.Mas enfim, Half-Life 2 é um exemplo de jogo eletrônico de qualidade, e certamente merece todos os prêmios que acumulou durante os anos, pois é bem sucedido em todas as áreas, passando pelos aspectos técnicos e design de níveis, até a sua surpreendente coesão temática, que entrelaça todos os aspectos do jogo em torno de uma única idéia, coisa que pouquíssimos jogos se arriscam a fazer (e menos ainda conseguem).Além disso, é um jogo que conseguiu ser bem-sucedido na tarefa monumental de superar seu antecessor, e também deixar sua marca na indústria, já que vários FPS atuais se aproveitam e evoluem o seu jeito diferenciado de contar uma história.E para quem não quer esperar por uma sequência de verdade, pode aproveitar os episódios já lançados, ou esperar pelo vindouro terceiro episódio (que promete trazer as respostas definitivas para os mistérios da saga - mas que certamente não vai).E se você não jogou até agora, jogue.È um dos poucos jogos que eu recomendo á todo mundo.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

"Mata-se o corpo, e não a alma."

Em alguns gêneros de jogos, é realmente um pouco difícil desafiar as convenções, pelo menos sem sair com uma experiência muito diferente da original, o que pode desagradar os fãs do gênero.Principalmente quando o gênero em si tem fãs ardorosos dessas convenções rígidas, como é o caso dos RPGs japoneses.Eu não vou explicar qual é a do gênero e nem que convenções são essas, porque além de eu já ter feito isso, esse negócio de ter que ficar explicando e contando historinha do gênero tal e empresa tal é a parte mais chata de fazer uma introdução.Como está aparente, eu não estou muito satisfeito com as minhas introduções, mas pelo menos dessa vez eu não tô apelando pra uma narraçãozinha meia-boca.Hã, o surto de reclamação metalinguística me fez fugir do assunto.Vamos começar isso logo antes que essa esquizofrenia súbita me impeça de continuar.


Vagrant Story foi lançado para o Playstation em 2000 pela Squaresoft, junto com outros títulos de peso, como Chrono Cross e Final Fantasy 9, e apesar de lançado pela fabricante conhecida pelos seus RPGs tradicionais, com inovações cirurgicamente localizadas, ele pode ser considerado tudo, menos convencional.Vagrant Story junta elementos que lembram Diablo, a (hoje esquecida) série Parasite Eve e os roguelikes, de forma a criar um sistema de jogo que pode ser complexo o suficiente para se perder nele.Nesse samba do japonês doido ainda entram puzzles de empurrar caixas, criação de armas e uma história que mistura magia negra, intriga, e referências á tragédias shakespearianas.O jogo se passa dentro do universo de Ivalice, idealizado pelo designer do jogo, Yasumi Matsuno, e que já havia sido explorado antes no complicado Final Fantasy Tactics, também para PSX, e depois com mais destaque em Final Fantasy 12, ambos "designerzados" pelo mesmo sujeito.Seus jogos têm a fama de investir mais na caracterização dos personagens, e em conflitos políticos e religiosos, e Vagrant Story não é exceção.


A trama se foca no personagem Ashley Riot, um Riskbreaker (uma espécie de agente secreto medieval) á serviço dos Cavaleiros Valendianos da Paz, um grupo responsável pela manutenção da lei e ordem em sabe-se lá qual que terra mágica o jogo se passa.No começo do jogo, o sujeito com nome de mulher e penteado esquisito é enviado para capturar Sidney Losstarot, líder do misterioso culto de Müllenkamp, que estaria secretamente envolvido com um influente membro do parlamento, o Duque Bardorba.Após Sidney atacar á casa do tal Duque, supostamente a procura de uma certa "chave", e ser interceptado por Ashley, ele foge para Leá Monde, uma cidade um dia muito próspera, mas agora destruída por constantes terremotos e está infestada de monstros.MAs esse lugar misterioso parece abrigar alguma força sinistra, o que não vai atrair apenas Sidney, como também os Crimson Blades, o braço armado inquisidor da igreja dominante da região de Valendia, e seu líder, Romeo Guildenstern.Se você está confuso com essa profusão de nomes e lugares, não se preocupe, a história do jogo é uma confusão mesmo, e como a ação se passa toda em Leá Monde, não espere que as coisas se esclareçam muito com o desenrolar do jogo.Felizmente, o foco da história do jogo não são os conflitos armados soporíferos de Valendia, e sim os personagens que se arriscaram a entrar em Leá Monde, e o que acontece com eles lá.


Mas mais sobre a história depois.O principal destaque do jogo é mesmo o seu robusto e muitas vezes hermético sistema de batalha.Pra começar, em Vagrant Story, só existe um personagem controlável no jogo todo (o sr. quebrador-de-risco Ashley), e não existem lojas para comprar itens ou lugares para dormir e recuperar energia.Todos os itens e armas são achados em baús, ou ganhos após derrotar um inimigo.Além disso, o sistema de combate pode lembrar um pouco um RPG de ação, mas também não é bem isso.Ao apertar o botão de ataque, se abre em volta do personagem um "grid" circular tridimensional (que é mais ou menos abrangente dependendo do alcance da sua arma), e se um inimigo estiver dentro dele, você pode selecionar que parte do corpo dele atacar.Atacar partes do corpo em específico pode funcionar como uma estratégia, já que acertar diversas vezes as pernas de um inimigo prejudicam sua velocidade, atacar os braços prejudica seu pode de ataque, etc...Mas como é muito mais fácil matar o inimigo de vez ao invés de ficar pensando nisso, este detalhe acaba sendo um elemento meio deslocado.Ao iniciar uma sequência de ataque, o personagem causará dano, e se o jogador apertar um determinado botão na hora que Ashley acertar o inimigo, poderá usar uma de suas Chain Abilities, uma mecânica que lembra um pouco Paper Mario.Mas ao contrário do jogo do carcamano gorducho, apertar o botão pode ter uma série de efeitos diferentes (que conforme o jogador vai enfrentando inimigos, Ashley vai se lembrando de mais desses efeitos), como causar mais dano ou recuperar energia ou mana.Também existem sequências de defesa, chamadas apropriadamente de Defensive Abilities, que oferecem uma série de atenuantes para o ataque do inimigo.Mas o uso indiscriminado dessas Abilities faz o personagem acumular RISK, uma variável que quanto mais alta estiver, mais diminui a eficácia dos ataques.Deixar a arma embainhada, faz o RISK diminuir, mas isso é algo bastante complicado nas batalhas mais intensas.


Outro diferencial de Vagrant Story é que o personagem não ganha níveis ou pontos de experiência, dependendo exclusivamente das suas armas para poder enfrentar inimigos mais poderosos.E é aí que entra um dos aspectos mais complexos de Vagrant Story, o sistema de criação de armas.Apesar de cada arma ter atributos iniciais básicos (como dano físico e dano "mágico"), existe uma série de outras variáveis que também influenciam em sua performance em combate.Cada arma do jogo é composto de duas partes, a lâmina e o punho, além de que algumas armas que permitem o encaixe de jóias que as deixam mais fortes.O dano que as armas causam é divido entre três categorias, Blunt, Edged e Piercing, e cada inimigo é mais ou menos resistente á um tipo de dano.Além disso, conforme se luta com uma arma, ela ganha afinidade com um determinado tipo elemento (Luz, Trevas, Fogo, Água, Terra, Ar e CORAÇÃO!!!!VAI PLANETA!!!!-brincadeirinha-), e uma arma com uma afinidade alta com um elemento vai causar mais dano em um inimigo do elemento oposto (Fogo-Água, Luz-Trevas, e por aí vai)E calma aí, tem mais; ainda existe um tipo de afinidade ganha quando se luta com um tipo de inimigo, como besta, humano ou fantasma, e quanto maior for essa afinidade, mais dano uma arma vai causar nesse tipo de inimigo.Enquanto a lâmina guarda as informações das afinidades elementais e de tipo de inimigo, o punho determina qual vai ser a força do tipo de dano que a arma vai causar (existem punhos com mais força em Edged, e outros com mais força em Blunt, por exemplo).


Forjar armas então é o processo de combinar lâminas e punhos, de modo a obter a arma mais poderosa possível.Ainda é possível combinar lâminas para obter lâminas mais poderosas, mas os materiais devem ser complicados, e todo esse processo só pode ser executado dentro de estruturas conhecidas como Workshops, que são raras de aparecer durante o jogo.O jogador deve-se preocupar ainda com os outros equipamentos, como escudos e armaduras, que também tem suas próprias afinidades, e também podem ser combinadas e equipadas com jóias.E (acredite), tem mais!Ainda há um sistema de magias, aprendidas em itens chamados Grimoires, e que são divididas em 4 classes: Warlock, que são as magias ofensivas, que francamente são muito ruins (mesmo usando magia de fogo contra um inimigo de água, o dano vai ser praticamente o mesmo de usar uma arma oa) e custam muita mana; Enchanter, ques são as magias que afetam as afinidades elementais das armas e armaduras;Sorcerer, que são as magias que afetam o status de Ashley e seus inimigos, além do ambiente á sua volta; e por fim,Shaman, que são as magias de cura, grupo que incluí a magia Heal, que recupera energia, e será usada provavelmente umas 745.652 vezzes durante todo jogo.


OK, prezado leitor, você ainda está aí?Òtimo, porque o sistema de combate de Vagrant Story é mesmo essa barafunda de informações e dados, o que pode (pode não, VAI) complicar a cabeça do jogador incauto.Mas o negócio é que muitas vezes, o jogo não está nem aí pra se você está entendendo ou não, visto que não há um tutorial obrigatório destrinchando as minúcias do processo de forjamento, ou dos efeitos das afinidades (há sim um extenso manual "embutido" no menu do jogo).E este é um jogo que pune duramente o jogador que o jogar "errado" sem se preocupar muito com as combinações de armas e estatísticas dos inimigos.Poucas coisas são mais frustrante que enfrentar um chefe e causar 2 ou 3 de dano a cada pancada, e procurar freneticamente no seu inventário por uma arma e ver que nenhuma presta contra o vilão em questão.Mesmo aqueles que se embrenharem fundo na selva de variáveis, ainda provavelmente encontraram alguns obstáculos, como o fato do sistema de forjar armas ser pouco intuitivo (a falta de um elemento visual torna este processo um mero malabarismo de números), e o jogador poder carregar um número relativamente limitado de itens, o que pode forçar o jogador á abandonar itens possivelmente úteis se não estiver preparado(existem baús de para guardar itens espalhados pelo jogo, mas além de eles serem meio raros, interagir com eles é um suplício, já que envolve saves obrigatórios e uma interface confusa).


E já que é pra reclamar, vamos continuar reclamando.Os grandes desafios ás suas habilidades de quebrador-de-risco e forjador-de-armas no jogo são as batalhas contra chefes, e algumas são realmente de arrancar os cabelos (e o jogo tem também uma das batalhas finais mais estupidamente difíceis que esse nerd masoquista já viu).Mas os corredores de Leá Monde também são habitados por vários tipos de criaturas, que constituem o pão-com-manteiga das rotinas de batalha do jogo.O problema é que, na segunda metade do jogo, a exploração se torna um pouco menos linear, então é necessário explorar mais o mapa, o que é bastante irritante, pois como o sistema de jogo não permite evitar batalhas, muitas vezes o jogador é forçado a lutar com inimigos que podem sim, ser muito fortes, imunes a muitas armas e com magias desmesuradamente apelonas.Outro detalhe bastante irritante é ter que trocar de arma frequentemente para poder causar algum dano nesses inimigos, o que torna a experiência do jogo um tanto truncada.E como esses inimigos são mais fortes do que se imagina, de repente, eles podem acabar mandando o pobre Ashley pra vala, o que além de forçar o jogador a ter que repetir um trecho é profundamente desmoralizante.Por essas e outras, a minha progressão pelo jogo foi repleta de pausas longas, que rendem a Vagrant Story o título de jogo analisado que eu mais demorei pra completar, num total de incríveis 13 meses, ganhando dos antigos recordistas Crimson Skies (8 meses) e Planescape:Torment (11 meses).


Mas eu acabei acabando o jogo, não?Isso quer dizer que há algo de muito satisfátório na experiência.O sistema, é inegavelmente complexo, mas um jogador dedicado, atento, e principalmente, paciente, conseguirá compreendê-lo e dominá-lo, e entender os desafios que o jogo irá propor.Conseguir compor uma arma quase perfeita, e estraçalhar um chefe aparentemente invencível na última jogada é profundamente satisfatório, principalmente quando isso feito entendendo os conceitos do jogo, e não na sorte cega.È lógico então que este não é um jogo indicado praquele pessoal que fica jogando Bejeeweled e Peggle, embora eu não sou um grande fã desses rótulos de "casual" e hardcore".E mesmo com todo essa carga de combate, o jogo ainda apresenta alguns puzzles de empurrar cubos (alguns bastante inteligentes, por sinal) e ocasionais desafios de plataforma para quebrar a rotina dos combates.


Mesmo com todo esse sistema de batalha complexo e elaborado, um detalhe que me chamou a atenção em Vagrant Story foi a sua história surpreedente boa.Ao invés do tradicional "grupo de heróis enfrenta vilãozão do mal", a narrativa aqui se concentra nos personagens, seus conflitos e intenções.O grupo de personagens é reduzido, e além dos já citados, existem outros, como Jan Rosencrantz, um outro Riskbreaker traiçoeiro, com suas próprias razões para estar em Leá Monde; Callo Merlose, a parceira de Ashley que é sequestrada por Sidney no começo do jogo, e exerce um importante papel durante a narrativa; John Hardin, o cúmplice de Sidney, que tem um passado nebuloso; Joshua, o filho mudo do Duque Bardorba; e Samantha, a amada de Romeo Guildenstern.A história é contada através de pequenas cenas que se interpõem durante o jogo (que lembram bastante a série Metal Gear, graças aos ângulos e rodopios cinematográficos da câmera), e que normalmente envolvem um diálogo entre os personagens citados. Não só a estrutura da narrativa, como a própria história, cheia de questionamentos morais e dilemas éticos lembra uma peça clássica de teatro. Além disso, os leitores mais literatos já devem ter sacado que os nomes Rosencrantz e Guildenstern fazem referência á dois personagens secundários da peça Hamlet, de William Shakeaspeare (que é, por falar nisso, um dos melhores, senão o melhor, livro já escrito. Sério.), o que só confirma a intenção da temática do jogo. Os próprios questionamentos de Ashley Riot sobre as suas certezas e lealdades lembram um pouco as dúvidas existenciais do príncipe da Dinamarca.E tudo isso se sustenta graças aos diálogos soberbos do jogo, que são muito superiores á da maioria dos RPGs, e talvez até dos jogos em geral.Mesmo assim, há quem vai achar a história confusa, pois muitos detalhes importantes são apenas indicados; porém, o importante mesmo é a brilhante composição dos personagens, e não no furdunço de magia negra onde estão metidos.


Vagrant Story oferece muitos motivos para jogar de novo (para os jogadores que não se traumatizarem com a primeira jogada), com uma opção de New Game +, que libera novas armas, áreas e materias para serem utilizados, além de uma série de "achievements" que vão desde o simples até o diabolicamente impossível.Aparentemente, muita gente se encantou pelo charme masoquista de Vagrant Story, visto que o jogo foi um sucesso de vendas (no Japão, pelo menos), e também faz parte do seleto grupo de jogos que ganhou quatro notas 10 da revista Famitsu, a mais respeitada publicação sobre jogos da terra do sol nascente (honra que partilha com jogos como Zelda:Ocarina of Time, Soul Calibur, Super Smash Bros. Brawl, e ...Nintendogs).Não faz muito tempo surgiram rumores de um possível remake para o PSP, mas estes rumores ainda esperam uma confirmação.Portanto, para os que se interessam por RPGs, um bom desafio, estatísticas matemáticas ou Shakeaspeare, fica a recomendação para conhecer a História do Errante.Afinal, pode não ser um jogo que vai agradar a todos, mas como dizia aquela música: "Different strokes for different folks".

domingo, 13 de julho de 2008

Como Àguias em Pula-Pulas

Imagine-se, se quiser, num bar esfumaçado, á meia-noite, num bairro pouco prestigioso da cidade.De um lado, bêbados lamentam amores perdidos de outrora.Do outro, figuras suspeitas cochicham as extorsões e execuções da semana, sob o olhar vigilante de um barman limpando canecas.E você, dado o lugar, certamente é algum detetive ás voltas com um caso insolúvel, alguma mulher fatal e um monólogo interno profundamente verborrágico.Essa é a atmosfera típica do universo noir, universo esse que já serviu de inspiração para inúmeras obras, inclusive, claro, jogos.Um até já foi analisado aqui, por sinal (com direito á uma introdução tão besta quanto esta que estou fazendo agora).Mas o jogo em questão agora não é um jogo que apenas se apropria dessa estética, mas que a subverte e adiciona elementos novos e elegantemente disparatados.E que também foi um último e ambicioso suspiro de um gênero gamístico com muitos admiradores, mas talvez um pouco contemplativo demais para os gostos agressivos e pouco atenciosos dos jogadores modernos.


Grim Fandango foi lançado em 1998 pela Lucasarts, num tempo remoto em que a empresa não lançava apenas jogos baseados naquela franquia dos Wookies.Na verdade, até meados da década de 90, a empresa era justamente reconhecida por seus adventures, como Day of the Tentacle, a série Monkey Island e Sam & Max.Mas o problema, é que como o gênero e mais afeito ao pensamento sobre resolução de enigmas do que agilidade em recarregamento de armas, ele acabou por ter uma perda de popularidade quando os gostos dos jogadores se voltaram aos jogos mais agitados, como os jogos de tiro de forte participação online, como Quake e Unreal.Grim Fandango acabou sendo o último adventure da empresa, e então é desnecessário dizer que ele encalhou nas vendas, a despeito das suas muitas qualidades (se eu analisar mais um jogo que foi um fracasso de vendas, esse domínio de web vai ter que mudar o nome pra Gamer Injustiçado).


Mas sobre o que exatamente é o jogo?Bom, como já foi citado, Grim Fandango (sem relação com aquele famigerado salgadinho composto de glutamato monossódico e isopor), Grim Fandango é um adventure, um estilo aonde o personagem resolve problemas e enigmas encontrando itens, examinando situações e falando com outros personagens.Na imensa maioria desses jogos, o personagem não pode morrer, então o principal obstáculo para a progressão do jogador é a sua própria capacidade de cadenciar os raciocínios muitas vezes obscuros que o jogo exige.Também, os adventures clássicos possuem tramas muito bem realizadas, como personagens memoráveis e diálogos hilários.È um gênero que pode ser comparado á um bom livro; foi feito para ser aproveitado com a cabeça relaxada, no final de um dia cansativo, acompanhado por uma boa xícara de café.


Por isso, um adventure vive e morre pela sua história (até mais do que os RPGs), já que a resolução dos enigmas está diretamente ligado á compreensão da trama (por exemplo, se o jogo for mais realista , uma solução absurda para um problema se torna menos viável; se ele for mais cômico, porém, resolver os problemas com galinhas de plástico pode ser muito lógico), e a narrativa serve como estímulo para os que possam achar o desenrolar do jogo meio modorrento.Felizmente, Grim Fandango tem uma história excepcional, e com uma direito á uma ambientação criativamente singular, de forma que é raramente vista em filmes ou HQs, que dirá no meio midiático viciado em clichês dos jogos eletrônicos.O jogo começa com o protagonista, Manny Calavera, como um agente de viagens na Terra dos Mortos.O trabalho dele é vender passagens para as almas que chegam do mundo dos vivos percorrerem a Terra dos Mortos em direção ao Nono Submundo, o local do descanso eterno.Esta viagem dura quatro anos, e é cheia de perigos pelo caminho, então, a forma como você se encaminha até lá depende das suas ações durante a vida; se você foi uma pessoa má, receberá no máximo uma bengalinha com uma bússola, ou talvez ser despachado num caixão com uma espuma de empacotamento fedida;porém, se você foi honestos, bondoso, e escovou os dentes antes de dormir, você poderá ir no luxuoso Número Nove, um trem bala que cruza a Terra dos Mortos em quatro minutos ao invés de quatro anos.


Manny é um funcionário do Departamento dos Mortos, e seu trabalho de vender passagens (algo que deve ser feito para pagar uma dívida com "os poderes acima") ultimamente parece não estar o levando a nenhum lugar, pois ele só recebe clientes vagabundos, enquanto os bons clientes ficam com o seu rival no Departamento, Domino Hurley.Até que um dia, graças á umas artimanhas bem-elaboradas, ele consegue a cliente perfeita, Mercedes Colomar.Mas aparentemente, o sistema não dá a Srta. Colomar o que ela merece, e então ela acaba indo embora fazer a travessia dos quatro anos por conta própria.Isso vai levar Manny a descobrir um esquema de corrupção dentro do Departamento, e acabar cruzando a Terra dos Mortos á sua procura.A história do jogo então se passa durante os quatro anos nos quais Manny irá procurar Meche, e nesse ínterim, ele passará de um mero funcionário público, para um fugitivo procurado, um dono de cassino e um capitão de navio.Durante esse período, ele conhecerá uma galeria de personagens pouco usuais (pra não dizer esdrúxulos), como o seu fiel "sidekick", o neurótico demônio Glottis, (invocado da própria essência Terra dos Mortos com apenas um propósito: DIRIGIR!), o líder revolucionário Salvador Limones, a femme fatale Olivia Ofrenda, o cruel chefe da máfia Hector LeMans, além de uma série de outros personagens pequenos, mas igualmente bacanas, que não pra citar nesse espaço.Todos os personagens do jogo têm os seus traços individuais e sua devida importância para a trama, e muitos que sumiram antes voltam para a história em dado momento, fortalecendo o conjunto coeso da narrativa.


Os diálogos também são dignos de nota:as frases trocadas pelos personagens são inteligentes e recheadas de ironia (e tem provavelmente a minha frase preferida já dita num jogo:"Is there a bigger constant than the treachery of women?"), e é tudo interpretado numa dublagem excelente, em autêntico "Spanglish" (vale lembrar que Grim Fandango, assim como o já citado Max Payne, também teve um versão com tradução e dublagem em português, esta toda em portunhol).E são essas referências á cultura mexicana que compõe boa parte da notável atmosfera do jogo, já que esses elementos, como a caracterização dos personagens como as típicas "calacas" mexicanas, a influência asteca na arquitetura dos ambientes, e a espetacular trilha sonora que mistura jazz e música latina (e que pode ser escutada de graça na internet), são fundidas com as típicas convenções dos filmes noir, o que aí incluí também referências a filmes clássicos do gênero.Isso traz ao jogo uma ambientação com charme e inteligência (mas talvez não o apelo de massa) de um filme da Pixar.O que pode explicar o seu fracasso comercial, afinal.


A movimentação dentro do jogo e dada de uma forma diferente dos tradicionais adventures; enquanto nesses o controle é feito apenas com o mouse, em Grim Fandango ele feito apenas com o uso do teclado, numa movimentação que lembra os jogos de survival horror (mas como aqui não há inimigos para se fugir ou matar, ele não tem os problemas típicos de movimentação travada que esses jogos acabam por ter).A interação com o ambiente se dá pressionando teclas que correspondem á uma ação do personagem (examinar, usar, pegar e consultar o inventário), e Manny irá realizar a ação requerida no objeto no qual ele estiver olhando.Se por um lado essas escolhas de interface contribuem para uma maior imersão na experiência do jogo, algumas vez é um pouco complicado interagir com partes do cenário, exigindo algumas tentativas até se conseguir realizar a ação desejada em alguns casos.


Mas no final das contas, um bom adventure não é nada sem os seus enigmas.Se eles forem muito fáceis, o jogador não vai se sentir desafiado, e se eles forem muito difíceis, ele vai se sentir frustrado.È uma linha difícil de caminhar, mas novamente, o jogo acerta, pelo menos na maior parte das vezes.A maioria dos enigmas é resolvido de uma forma tradicional dos adventures, como por exemplo, retirando um objeto de uma situação o e o aplicando em outra, ou levar um personagem a fazer alguma coisa a seu favor.È lógico que existe um raciocínio um meio particular do designer do jogo quanto á solução que deve ser empregada nos enigmas (inclusive algumas soluções são hilariamente absurdas, como congelar gelatina vomitada com nitrogênio líquido com a intenção de desativar uma bomba acionada por dominós), mas pensar um pouco normalmente se revela mais eficaz que combinar cada item do seu inventário com cada pedaço do cenário.Porém, sempre existem aquelas exceções mais irritantes, especialmente os enigmas onde não é necessário o uso de itens do inventário ou interações com personagens, e sim a compreensão de pistas nem sempre muito claras que o jogo fornece.


Grim Fandango tem uma duração considerável para um adventure, e se torna uma experiência rica, visto que, como dito antes, os enigmas são muito bem entrelaçados com a história, o que realmente faz as mecânicas do jogo parte da trama, e não coisas dissociadas.A ambientação também é um acerto, já que o cenário da Terra dos Mortos é pródigo em alegorias para a vida após a morte; além disso, dado o tema do jogo, mesmo com os impagáveis diálogos e o completo absurdo de algumas situações, existe uma sutil melancolia que pontua as aventuras de Manny, o que prova a vontade dos criadores do jogo em contar uma história alguns degraus acima do que normalmente narrado nos jogos(E por falar em criadores, o jogo foi "designerzado" por ninguém menos que Tim Schaffer, também o designer de outro favorito pessoal meu, o indefectível Psychonauts, que coincidência ou não, também foi um fracasso de vendas - mas eu acho que o seu próximo projeto, Brütal Legend, tem apelo mainstream o suficiente para finalmente dar uns tocados pro sujeito).Por essas e outras, Grim Fandango, mesmo sendo lançado á mais de dez anos atrás, continua sendo uma grata surpresa para jogadores, e continua ganhando fãs tardios; existem muitos até que o consideram o melhor adventure já lançado.Ao que parece, ultimamente os adventures estão lentamente voltando á moda, graças á jogos como as aventuras episódicas de Sam & Max (e, como comentário pessoal, esses também são ótimos - se você for fã de adventures, ou de bons jogos em geral, não deixe de jogar), então parece que os nossos gostos primitivos estão ficando mais receptivos á experiências mais reflexivas.Então, Grim Fandango fica sendo altamente recomendado, mesmo para aqueles que torcem o nariz para adventures.Afinal de contas, nós nunca sabemos o que está no final da linha, então, o melhor a fazer é aproveitar a viagem.